Juízes não podem limitar o número de páginas
das peças produzidas pelos advogados, pois essa medida pode até ser
considerada inconstitucional. Esse é o entendimento que se firma nas
opiniões do ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do
Tribunal Superior Eleitoral, Dias Toffoli; do jurista Lenio Luiz Streck;
do advogado e juiz suplente do Tribunal Regional Eleitoral Alberto
Zacharias Toron; e do promotor e mestre em Direito Público, André Melo. Essa
questão foi levantada depois que a 2ª Câmara de Direito Comercial do
Tribunal de Justiça de Santa Catarina manteve a decisão que obrigou um
advogado a reduzir sua petição inicial, relacionada à ação de revisão de
contrato bancário, de 40 para, no máximo, 10 laudas. O relator do caso,
desembargador Luiz Fernando Boller, afirmou que "uma peça enxuta, clara
e bem fundamentada é lida e tem chance de ser acatada. Já outra, com
20, 35 ou 50 folhas, provavelmente não”. Disse, ainda, que a exceção ao
seu entendimento ocorreria em “uma ação de grande complexidade”. De
acordo com Toron, o ideal é que as petições sejam concisas, indo
diretamente ao ponto. Apesar disso, ele ressalta que “o advogado quando
elabora uma petição é soberano” e não pode ser obrigado a reduzir o
tamanho de sua petição. "Trata-se, portanto, de atividade indevida a do
magistrado que censura o advogado ou mesmo determina que ele reduza o
seu trabalho escrito”, afirma. Não há nada na lei ou na Constituição que determine o tamanho de um petição, afirma Lenio Streck.Com a mesma opinião, Lenio Streck diz que juiz “não pode e não deve”
censurar o advogado, pois o julgador não é censor nem professor,
enquanto estiver dentro da corte. “Juiz decide nos autos e segundo o
Direito. E não há nada, mas nada mesmo, escrito em lei alguma ou na
Constituição sobre o tamanho de uma petição”, explica. Sobre a decisão noticiada,
o jurista afirma que o juiz tentou ser “ativista” em seu entendimento.
“Ao decidir desse modo, ele criou direito. E isso torna a sua decisão
absolutamente inconstitucional, porque violou a separação de poderes”,
complementou. Streck também ressalta o fato de que as decisões das
cortes, muitas vezes, também são longas. “Há votos de ministros do
Supremo Tribunal Federal com mais de 200 páginas. O juiz de Santa
Cataria vai censurar o ministro?”, questiona. O jurista afirma
ainda que tal medida vai contra a liberdade profissional do advogado,
pois não seria possível delimitar algo intangível, como a complexidade
das ações. “Assim, como não é possível dizer qual é o numero de paginas
máximas de um voto de um desembargador ou de uma decisão judicial. Nem
limitar o voto dos ministros do STF ou os minutos do voto na TV Justiça.
Não se pode pensar que vamos melhorar a prestação jurisdicional com o
tamanho das petições”, diz. Bem recheadas
Um dos argumentos usados pelo TJ-SC na decisão foi a influência da
informática no Direito. O desembargador Boller afirmou que o "copia e
cola" estimulou longas manifestações e que as discussões abstratas dos
cursos de mestrado trouxeram aos tribunais o hábito de alongar as
considerações. O ministro Dias Toffoli e o promotor André Mello
concordam com a afirmação. Ambos destacaram o fato de que, após a
inserção dos computadores no meio jurídico, houve um prolongamento das
peças e, em certos casos, inserção de excessiva de informações. Tecnologia facilitou criação de peças mais longas, mas não cabe a magistrado censurar, diz toffoli.Fellipe Sampaio/SCO/STF“Entendo que com a tecnologia de informação hoje existente fica muito
fácil fazer o "corta e cola" e, com isso, deixar as petições bem
recheadas. Muitas vezes com excesso de informações. Todavia não cabe ao
magistrado censurar o tamanho da petição”, opina o ministro Toffoli. “Concordo
que a informática contribuiu com o excessivo aumento do número de
páginas. Porém, acredito que seria interessante uma recomendação para
que as partes e juízes reduzam número de páginas. Nos Estados Unidos,
geralmente, as peças são ‘enxutas’, no Brasil tem havido uma tendência
de se escrever muito para questões óbvias”, afirma o promotor. Indo
na contramão, Streck afirma que não é razoável culpar o meio usado ou a
técnica aplicada. Segundo ele, modos de trabalho e tecnologias podem
facilitar e dificultar a execução de uma atividade. “A técnica e a
ciência não pensam. Existem advogados irresponsáveis que utilizam o
método hermenêutico 'Ctrl + C' e 'Ctrl + V'. Mas há numerosas sentenças
que são proferidas usando essa mesma 'metodologia'. Ou seja, a
informática é para o bem e para o mal”, afirma. Enxuto, coeso e lógico
Também em sua decisão, o desembargador Luiz Fernando Boller, afirmou que
se a redução da petição inicial não afetar a coesão do texto e a linha
de raciocínio dos argumentos, não há nenhum problema em diminuir a peça. Toron sugere que, em peças mais longas, advogados façam um resumo para facilitar a leitura por juízes.Sobre esse ponto, Toron destaca a necessidade “logicidade da peça” e
apresenta como alternativa à redução do uso de ementas. O advogado conta
que sempre faz resumos em Habeas Corpus e petições mais longas. “Da
mesma maneira que nós advogados, antes de lermos o acórdão, lemos a sua
ementa, para ter uma pré-compreensão do que leremos adiante, o juiz
também tem facilitado, dessa forma, o seu trabalho de leitura”, diz. O
criminalista também afirma que a inserção de ementas em petições longas
também permite ao advogado rever seus argumentos e melhorá-los. “Mas
fazer uma ementa, muitas vezes, nos obriga rever o próprio trabalho para
acertá-lo logicamente e, não raro, nos permite resumi-lo ainda mais”,
complementa.
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